Thank heaven for little girls…

terça-feira, 27 de abril de 2010
"Thank heaven for little girls," canta Honoré Lachaille (Maurice Chevalier), “Thank heaven for them all, no matter where, no matter who, without them, what little boys do?”

Ao contrário do que hoje poderia ser considerado como um verdadeiro sacrilégio, bem como uma grande apologia à pedofilia, esta deliciosa canção que compõe o vasto repertório de Alan Jay Lerner e Frederick Loewe, celebrava a potencialidade que existe na juventude feminina, dando início à narrativa da comédia musical Gigi, cuja história foi adaptada do romance escrito por Sidonie Gabrielle Colette.

Gigi cantando The Parisians.

O cenário do filme, dirigido por Vincent Minelli, é estabelecido em Paris do início do século 20, introduzindo o tema que será desenvolvido ao decorrer do longa-metragem através da observação cínica de Honoré, que afirma que até mesmo na cidade do amor - título atribuído a capital francesa - nem todas as pessoas têm chance à vida matrimonial. Para os homens, esta é uma decisão tomada por si próprios, ao dizerem não ao casamento em prol do status de "old bachelors". Para as mulheres, a decisão é, consequentemente, imposta. A elas, só lhes resta o destino de "old maids".

Ao sobrinho rico de H. Lachaille, por exemplo, prevalece a primeira opção. Gaston Lachaille (Louis Jourdan) tem potencial como futuro partido das mocinhas que constituem a sociedade parisiense, mas este permanece até então como solteirão. Seus momentos de distração e fuga do tédio são encontrados ao lado de Madame Alvarez (Hermione Gingold) e sua neta, Gilberte (Leslie Caron). Gigi, como assim é conhecida, é uma mocinha jovem e precoce que tem como parte de sua rotina ter que freqüentar a casa de sua tia avó Alicia (Isabel Jeans), para que possa aprender lições de etiqueta e charme. A jovem garota é incapaz de compreender a real necessidade de se tornar uma cortesã, e no que isto implicaria para o seu futuro. Gigi gosta mesmo é de passar o tempo com Gaston, a quem ela, até então, vê com um olhar fraternal, como se o rapaz fosse um irmão mais velho.

Leslie Caron, interpretando Gigi

O inevitável, ao assistir Gigi, é não traçar um paralelo entre o presente filme e o sucesso antecessor da dupla, My Fair Lady. Alguns princípios básicos entre as histórias são ingredientes comuns à receita de bolo que aqui se repete. Isto porque Gigi, assim como Eliza Doolittle, também é submetida ao processo de evolução de patinho feio a cisne, ainda que diante de situações distintas. Ambas têm por necessidade saírem de seus respectivos casulos convertidas a verdadeiras “ladies” da sociedade, educadas de tal maneira que pudessem encontrar um marido que correspondesse a sua altura. Também é introduzida a figura do solteirão invicto e de mais idade, aqui representado por Gaston, ainda que este não possua características similares e que definem tão bem a personagem de Henry Higgins em My Fair Lady. Dando base a minha opinião, em uma review publicada pelo New York Times, o jornalista Bowler Crowther alega que as semelhanças entre os sucessos de Lerner e Loewe são tamanhas que talvez os autores quisessem processar a si mesmos, e reitera dizendo que esta, na verdade, não é uma crítica desfavorável ao filme.

Uma curiosidade que conecta uma obra a outra é a música Say a Prayer For Me Tonight, cantada pela personagem Gigi. A canção que fora composta originalmente para My Fair Lady seria interpretada por Julie Andrews, atriz que viveu Eliza Doolittle nos palcos da Broadway, durante uma cena onde o objetivo seria demonstrar todo o nervosismo da vendedora de flores na noite que antecederia o baile de gala, onde o trabalho de Henry Higgins e Colonel Pickering seria colocado a prova. Com a eliminação da cena, a canção foi reaproveitada.
Ainda que seja o Universo oferencendo uma grande piada cósmica, podemos citar também o fato de que Audrey Hepburn, que viveu Eliza Doolittle na produção do longa-metragem de Jack Warner, interpretou Gigi nos palcos em 1952. Na verdade, o papel ainda foi oferecido a ela antes que o passassem a Leslie Caron, conhecida por An American in Paris.

Gigi e sua tia-avó Alicia, aprendendo a avaliar pedras preciosas.

A parceria entre o diretor Vincent Minelli e Cecil Beaton, que havia trabalhado anteriormente tanto na produção de Fair Lady para Broadway quanto para o cinema, casou perfeitamente, proporcionando visual e figurinos sensacionais da vida e costumes parisienses. São elementos como estes que colaboraram para a construção deste que é considerado o último grande musical da MGM. Gigi não foi sucesso unânime de público ou de crítica, mas arrebatou nove Academy Awards na cerimônia de 1959.


Ainda, carregando o seu próprio charme, e sendo completamente capaz de andar com suas próprias pernas, Gigi garantiu seu lugar de importância na história do cinema, cativando-nos e nos fazendo "agradecer aos céus por existirem jovens garotinhas."

4 comentários:

  1. Amei a review! Muito bom mesmo o texto! Como você já notou, amei Thank Heaven for Little Girls, achei essa música ótema! E Gigi é um filme belíssimo, merecedor de todos os premios recebidos.
    Também senti uma conexão com My fair Lady, e já havia lido em algum lugar que Audrey chegou a fazer a peça. Gostaria muito de assistir somewhere.

  1. As Tertulías disse...:

    Say a pray for me tonight... Sim Julia ensaiou esta música que depois foi substituída por uma outra, que também foi cortada, pois jamais na relacao entre Higgins e Eliza a palavra "amor" é mencionada... Bem, sucesso ou nao na época "Gigi" é um filme eterno, maravilhoso. O tema (que nos leva à uma outra interpretacao do "complexo de Conderella"´) é também de certa forma "imortal". Pensem em "Sabrina" ou "Funny Face" ou "Pretty Woman" ou "Dama por um dia" ou até "Gypsy"...transformar um ser humano criando uma nova língua? Mas também uma nova diccao, usando um novo guarda roupa. colocando-o em outro meio... como William Holden diz em "Paris when it sizzles": Voce já reparou que My Fair Lady e Frankenstein tem o mesmo roteiro? Gigi nao está muito distante desta metáfora...
    Beijos Lorena e continue assim, abordando temas tao simpáticos!
    Ricardo

  1. Lorena, sou apaixonada por esse filme! Adoro ouvir o Maurice cantando "Thank heaven", o belo Louis Jordan cantando "Gigi", surpreso por seu coração duro ter sucumbido ao charme da mocinha e a Leslie (como ela está bonita nesse filme!) cantando minha preferidíssima, "The night they invented champagne".

    É um filme tão meigo que a gente se esquece que ele mostra a transformação de uma menininha em cortesã. Também, não acho que era o objetivo de Vincent Minelli deixar isso tão claro. Talvez isso prejudique um pouquinho o desenrolar da história, pois numa olhada mais rápida, não entendemos muito bem porque a jovem está tão agoniada de se casar com o homem bonito, endinheirado e de quem ela gosta. Deve ser por isso que gostei tão mais do filme quando o vi pela segunda vez...

    Seu post me fez voltar a um livro que adoro, "The Audrey Hepburn treasures". Estou segurando uma edição facsimilar do programa de Gigi, repleto de fotos da adaptação na Broadway, dedicado por Audrey para uma "Darling Kay". Ela deve ter dado uma Gigi bem bonitinha!

    Adorei seu post, Lorena! Estou com comichão de atualizar meu blog também. Vou tentar.

    Bjocas
    Dani

  1. Lorena, está tudo bem contigo. Apareça! No seu blog, no meu blog, em qualquer lugar, mas dê sinal de vida!

    Espero que essa sumida seja só resultado da correria.

    Bjs
    Dani

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